A necessidade do trabalho para o sujeito está intimamente ligada à sua construção de identidade, ao seu papel social e à sua autoestima. A atividade profissional é vista como uma provedora do sentido da vida e reconhecimento social, não se tratando somente de fatores econômicos, mas também da necessidade de se sentir incluído na sociedade (BARROS E OLIVEIRA, 2009). Trata-se, ainda, de ser “[…] o sentido de bem-estar, autor, realização, fonte de prazer e importante fator na construção da subjetividade dos sujeitos. Desse modo, o trabalho, ocupando um lugar relevante na vida das pessoas, passa a ter relação direta com as condições de saúde tanto física quanto mental” (CARTILHA PARA PROFISSIONAIS DO SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE – SUS, 2014, p. 6).
É neste momento, ao se inserir no trabalho, que o sujeito desenvolve a sua identidade, a partir de um novo contexto social, modificando seu modo de pensar e agir no mundo. Além da possibilidade de remuneração, que também acaba fornecendo a ele um papel economicamente importante dentro do contexto familiar, pois passa a contribuir e ser visto como um trabalhador e não desempregado. Porém, quando os jovens não conseguem se recolocar no mercado de trabalho, a qualidade de vida e o bem-estar são diminuídos, propiciando cada vez mais efeitos negativos sobre sua saúde, como a baixa autoestima, angústia, desesperança, o sofrimento, pois o trabalho acaba sendo um norteador para a sua vida, logo, sem ele, é como se não houvesse caminho (MONTEIRO; VALE, 2011; GUILLAND; MONTEIRO, 2010).
Barros e Oliveira (2009, p.98), em suas pesquisas, apresentaram dados que correlacionavam desemprego e saúde mental, demonstrando associações entre sofrimento psíquico-social e o estado de saúde geral, tendo como resultados a existência de “[…] sofrimentos relacionados à baixa autoestima, estado de ânimo e humor reduzidos, estresse, ansiedade, sentimentos de vergonha, humilhação e distúrbios no sono”. Além disso, houve a constatação de que os sentimentos mais mencionados pelos participantes, referentes à situação de desemprego, foram: sentimentos depressivos (18,8%); sofrimento; frustração e angústia (13,5%). Ainda foi possível mencionar os fatores sintomáticos, como estresse psíquico e desejo de morte.
Nesse contexto, a partir de uma pesquisa feita por Wickert (2006, p. 264-266), no estado do Rio Grande do Sul, percebeu-se que quando o jovem não está ativamente dentro da sociedade, com dificuldades na inserção profissional, os sonhos que o moviam acabam sendo deixados de lado, ficando desmotivado e não vendo mais o trabalho como um norte para a construção de seus planos futuros. “Quanto mais tempo ficam a procurar por uma colocação laboral, maior é a renúncia a suas vontades, a seus sonhos, a si próprio.”
Assim, ele tende a se afastar do meio social e passa a buscar um reconhecimento dentro do meio familiar, mas isso gera seu isolamento, pois a família exige muito desse jovem, gerando ainda mais sofrimento. Tal situação também é discutida por Guilland e Monteiro (2010), uma vez que a relação familiar do jovem e a relação que ele tem consigo e a sociedade influenciam no seu estado emocional e psicológico. Em suas pesquisas, os autores perceberam que entre os grupos de desempregados jovens e adultos, a categoria jovem é bem mais vulnerável a problemas ligados à saúde psicológica.
Outro complicador é a cobrança de uma melhor escolarização e de experiências no mercado de trabalho, havendo uma pressão ainda maior sobre si. O sujeito, então, acaba, por muitas vezes, precisando aceitar qualquer coisa para poder se incorporar no mercado de trabalho. Muitos entrevistados relatam sentir raiva, desânimo e que se sentem culpados, gerando, como consequência, o sofrimento (WICKERT, 2006).
Wickert (2006) também confirma essa situação, pois conforme suas afirmações, quando o jovem que está ativamente na busca por emprego, dentro da sociedade, vê-se com múltiplas barreiras que dificultam sua inserção profissional, acaba se desmotivando, deixando de lado seus sonhos, tendo em vista as impossibilidades de construir planos para sua vida. O autor ainda completa que quanto mais tempo esses jovens passarem desempregados, mais desanimados com suas possibilidades ficam, sendo capazes de desistir de seus anseios.
Sendo assim, tais manifestações negativas que surgem pela busca de trabalho, como ansiedade, insatisfação com a vida, baixa autoestima, dificuldades cognitivas e conflitos nas relações familiares, acabam gerando uma diminuição no estado de bem-estar do jovem, com isso, ele pode desenvolver sentimentos de inferioridade, pessimismo, vergonha, introversão, isolamento social e depressão (ESTRAMIANA, 1992; APUD BARROS; OLIVEIRA, 2009).
Essas condições acabam gerando o desalento no qual pessoas desempregadas, que gostariam de trabalhar, desistem de procurar emprego, porque perderam as esperanças, ou seja, esse grupo está desanimado sobre suas possibilidades, sente-se perdido, impotente e incapaz. Segundo o IBGE, desalento é quando uma pessoa quer trabalhar, mas deixa de procurar emprego por não conseguir ocupação adequada, não ter experiência ou qualificação, ser considerada muito jovem ou idosa, ou não haver trabalho no lugar onde mora. Em sua maioria, são grupos compostos por jovens de 18 a 24 anos, sendo a maior parte de mulheres, pessoas de cor parda ou negra e de baixa escolaridade.
E essas consequências acometidos pelo desemprego estendem seus reflexos não só sobre o próprio sujeito, mas também sobre aqueles que com ele convivem. Desse modo, entender as variáveis que podem impactar esse cenário psicossocial, pode ser muito útil para o desenvolvimento de um olhar clínico para esses efeitos emocionais e psicológicos. Havendo a necessidade de um acompanhamento psicológico, ações preventivas e um maior investimento no desenvolvimento psicossocial desses jovens.
BARROS, Celso Aleixo de; OLIVEIRA, Tatiane Lacerda de. Saúde Mental de trabalhadores desempregados. Rev. Psicol., Organ. Trab., Florianópolis, v.9, n.1, p.86-107, Jun. 2009.
GUILLAND, Romilda; MONTEIRO, Janine Kieling. Jovens e desemprego: estado da arte. Rev. Psicol., Organ. Trab., Florianópolis, v. 10, n. 2, p. 145-158, Dez. 2010.
INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA – IBGE Síntese de indicadores sociais: uma análise das condições de vida da população brasileira: 2017 / IBGE, Coordenação de População e Indicadores Sociais. – Rio de Janeiro: IBGE, 2017b 147p. – (Estudos e pesquisas. Informação demográfica e socioeconômica, ISSN 1516-3296; n. 37) Disponível em: https://biblioteca.ibge.gov.br/index.php/biblioteca-catalogo?view=detalhes&id=2101459
MONTEIRO, Rodrigo Padrini; VALE, Zoé Margarida Chaves. O jovem e a primeira experiência de trabalho. Rev. bras. Psicodrama. São Paulo, v. 19, n. 2, p. 113-124, 2011.
WICKERT, Luciane Fim. Desemprego e juventude: jovens em busca do primeiro emprego. Psicol. cienc. Prof., Brasília, v. 26, n. 2, p.258-269, Jun. 2006.